Foto de Philip LePage
‘Leonor, vou ter com o André para estudarmos a maqueta do catálogo. Quando o Dr. Mendonça Vargas sair, por favor diga ao Pedro que só voltarei depois de almoço.’ Voltou ao gabinete para pegar na mala e no dossier onde tinha o processo com a informação relativa ao catálogo. Enquanto descia no elevador procurou na mala as chaves do carro. A razão gritava-lhe para não mergulhar nas memórias de que não conseguia fugir; para as quais procurava resolução mas sem encontrar caminho. Aquelas palavras enigmáticas, aquele telefonema que lhe transformara a sua intenção… era inexplicável a forma como a tinham perturbado verdadeiramente. Afundada nestas lembranças ligou o carro, saiu do parque, subiu a rampa e aguardou que lhe permitissem entrar no trânsito. Era quase hora de almoço e o movimento começava a aumentar. O vermelho acendeu-se no semáforo e obrigou-a a parar. Ao olhar no retrovisor percebeu que outro olhar também lá estava. Impulsivamente manteve o seu olhar no espelho e consequentemente no outro olhar que a olhava. Mas… aquele olhar lembrava-lhe algo… era como se o já tivesse visto… mais ainda… era como se este fosse a repetição dum momento já vivido. Tentou afastar estes pensamentos e prometeu a si própria ir ao médico o mais breve possível. Na fracção de tempo que passou voltou a olhar o espelho e… o outro olhar continuava lá. O verde acendeu-se. Pôs o carro em movimento e tentou concentrar-se no que iria discutir com o designer.
...
‘André, parece-me bastante bem. No entanto, peço-lhe que crie um pouco mais de espaço entre os limites do bloco de texto e a mancha de fundo, tente dar, ainda, um pouco mais de respiração e... talvez esbater ligeiramente alguns tons. Acho que prefiro uma maior transparência. As cores menos marcadas parecer-me-ão mais cativantes. Mas muito bem. Gosto. E são muito interessantes estas discretas alusões ao catálogo passado. Não estou tão certa de ser necessário termos no final essas mesmas marcas mais vincadas...’
‘Pense na fidelização dos seguidores. Ao longo do catálogo essas referências podem ser simplesmente uma opção gráfica. Só os seguidores fiéis poderão, eventualmente, referenciá-lo como uma recordação do passado. O seu reforço, no final, pretenderá confirmar essa cumplicidade. Aí terão a oportunidade de voltar atrás e confirmar as lembranças, de perceber onde viram e quais as memórias que guardaram…’
’É isso André!!!’
’Desculpe…’
’Obrigado André! Consegui! Parabéns! Está magnifico! E a sua dica foi fantástica!’
’…!’
… conseguira voltar atrás… ao dia da batida.
2 comentários:
Pas(ç)sos,
Texto muito bem escrito... claro! Mas no mínimo intrigante!! Fico à espera da continuação que, quase adivinho, mas quero confirmar!!
Continuo a ler esperando as voltas que a escrita e criatividade nos podem oferecer.
Até mais.
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