domingo, 24 de maio de 2009

CONQUISTAS

Foto de Dare Turnsek

Há muito, muito tempo, quando as madrugadas se douravam no mar, num reino muito longe daqui, para além da fronteira do sol, havia um soberano reconhecido e respeitado por suas conquistas. O seu tempo, e o dos seus mais próximos servidores, era gasto a descobrir novos objectivos, planear estratégias e consumar os actos que alargassem os seus horizontes de domínio. A sua arte de delinear e preparar, mais do que as armas e o poderio humano, garantia-lhe o sucesso das suas demandas. A contundência das novas invasões eram garante de êxito e obediência por parte das vítimas que se vergavam à sua superioridade e que acabavam por ceder e lhe prestar vassalagem.

Um dia o soberano chamou o seu filho varão e ordenou-lhe que partisse em busca de novas conquistas. Que alargasse o reino que viria a ser seu, uma vez que herdasse o seu reinado. Era a primeira vez que lho exigia. Seria a primeira vez que o príncipe partiria na tentativa de imitar as pisadas do pai. Determinou, ainda, o rei que acordasse com o seu conselheiro de armas, a quantidade e variedade de equipamento bélico a preparar, bem como a quantidade de homens que o serviriam. Não quis o rei dar-lhe nenhuma directriz, com o intuito de lhe mostrar confiança e estimular a sua responsabilidade e capacidade de decisão de futuro monarca.

Desconheciam os conselheiros reais as intenções do príncipe quando este se lhes dirigiu. Mais espantados ficaram quando o infante lhes revelou querer partir sozinho com a sua montada. Por considerarem não dever duvidar das intenções do príncipe, a quem aliás o rei não havia dado propósitos concretos, os conselheiros reais admitiram que o filho do monarca partiria apenas em prospecção. Mesmo assim decidiram nomear uma escolta para responder pela segurança do futuro rei.

Umas semanas mais tarde, o príncipe apresentou-se perante seu pai. Após um abraço mais formal do que familiar, o rei pediu: ‘Dizei-me meu filho o que haveis conquistado, quem Vos jurou fidelidade, quem fizestes Vosso prisioneiro?’ O príncipe respirou, parecendo tomar fôlego para o que se preparava dizer. ‘Meu senhor, conquistei o coração mais belo, da dona do rosto mais desenhado do mundo. Jurámos fidelidade eterna um ao outro e fui eu que me tornei prisioneiro do seu sublime coração!’ O rei caiu em si. Ruborizou-se-lhe o rosto. Deu um passo em frente e gritou: ‘Re ti raaaaaaaai-Vos!’ O príncipe baixou a cabeça. Imperceptivelmente pediu: ‘A sua bênção meu pai!’ Recuou em direcção à saída e voltando-se passou a porta do salão. Ficou sem perceber se o pai ficara desiludido por ele não ter cumprido as expectativas que criara em torno da missão de que o incumbira; se teria compreendido quanto mais importante poderá ser a conquista dum sentimento que abra, de par em par, as janelas da alma, do que inúmeros avanços terrenos conseguidos por força das armas e da força… ao sair, o príncipe não se apercebeu de que o rei virara as costas para a entrada, a fim de dissimular uma lágrima que lhe escorria pelo rosto.

2 comentários:

helenabranco.poet@gmail.com disse...

sim...esse "eucontar" é o superlativo absoluto composto da inteligência...escrito com a sabedoria dos ascetas e a beleza de um ser admirável!...




ABRAÇO maior...

Alexandra disse...

Até os mais duros têm o mar nos olhos...mas esse, só brota quando a emoção emerge apanhando desprevenida a razão.


Só alguém com um EU belo poderia "eucontar" esta "Estória".

Até mais.