
terça-feira, 31 de março de 2009
A VERDADE DAS PALAVRAS

DIZ-ME

Foto © Agnieszka Kowalska
Diz-me! O que faço às cinzas da paixão que deixámos arder? E as memórias do que fomos deixando ser nosso, onde as guardo? E os desejos que ficaram por revelar e por realizar, como os posso domar? Sabes? Diz-me se souberes. Às cinzas tenho medo de as enterrar. Podem transformar-se em sementes e voltar a florescer, ainda com mais força, com redobrado vigor, e dar como fruto uma paixão ainda mais ardente. Alojo as memórias no coração? Sim, sem dúvida, é o local privilegiado por natureza para o fazer. É o terreno onde a ternura sabe cuidar, sabe tratar o que se quer guardar para preservar. É verdade!... mas queres que te diga? O coração fica no peito. E o peito está tão apertado e tão tenso que não sei se vai suportar um coração forçado a duplicar-se, ou mesmo triplicar… ainda que as memórias fiquem bem aconchegadas, bem juntas, bem abraçadas como lhes sabe bem estar… E os desejos? Seguro-os? Diz-me como! São resistentes… mais fortes que o vento… que a corrente dum rio… mais obstinados que a inevitabilidade do destino. Mesmo que não queira teimarão em voar… em desbravar terrenos, explorar o céu… atropelarão as estrelas… derrubarão as palavras… e, incapazes de se desprenderem das cinzas e libertarem das memórias, temo que o seu destino seja o não pretendido…
domingo, 29 de março de 2009
sábado, 28 de março de 2009
DESPEDIDA

Foto © Jon Gibbs
Sentados nos degraus da madrugada, abraçava-nos a penumbra das horas esgotando-se no tempo que mediava até à despedida. A neblina dissipava-se nos primeiros sorrisos de luz. Um mar de estrelas adormecia submergindo num céu gradualmente mais azul. Um vento espreguiçado arrepiava a pele e soprava prolepses da despedida. Cobrimos com nossas próprias mãos os braços despidos, arrepiados no sono não dormido. Cada palavra era o início duma frase que calávamos, para não dizer, para não magoar, para não deixar marcas, para não deixar saudade. Em silêncio adivinhávamos as outras palavras que nenhum ousava expressar. Palavras que concluíam o que não se desejava terminado. Levantámo-nos e caminhámos lado a lado, linhas paralelas que desejavam se cruzar, mas perdiam essa coragem a cada passo mais, a cada segundo menos. À nossa frente, a espuma do mar atraía-nos como se fosse o destino, sendo na realidade a partida para a separação. Nas nossas mãos os dedos travavam o desejo de se tocarem, e as nossas passadas cada vez mais perto da água. A nossa pele já conseguia sentir a fragrância do sal. Detivemo-nos. E pedimos ao tempo só mais um momento… ao momento só mais um instante… o instante duma inspiração… o instante dum arrepio… só mais uma rebentação… só mais um desejo… só mais o momento necessário para dizer duas palavras… ligadas entre si… apenas cinco letras… antes do adeus.
sexta-feira, 27 de março de 2009
COISAS QUE O TEMPO NÃO NOS ENSINA A ENSINAR

quinta-feira, 26 de março de 2009
EVADIDAS

- Peço desculpa, mas quem devo anunciar?
- Creio que a minha identidade não será o mais importante.
- Lamento, mas qual é o assunto?
- Permita-me falar com o Senhor Cônsul. Diga-lhe que o assunto é de interesse superior!
…
- Boa-tarde! Quer ter a amabilidade de me explicar o que se passa?
- Senhor Cônsul, acredito que tenha conhecimento de terem sido recentemente libertas palavras…
- Sim, sim. Estou a par do assunto. Mas o que a leva a contactar-nos?
- Senhor Cônsul, receio que algumas das palavras anteriormente detidas se tenham evadido antes da autorização para serem libertas…
- E poderei saber o que a leva a revelar-me essa suspeita?
- Essas palavras que se evadiram procuraram refúgio em território, temporariamente, sob minha administração. Contudo porque não estava presente a nossa especialista em vocabulário de sentimentos e emoções, não conseguimos entender o que pretendem dizer. Falam com sentidos ambíguos, usando metáforas, verdadeiramente difíceis de entender fora do provável contexto com que foram escritas…
- Estou a compreender… mas de que modo julga que a possamos auxiliar?
- Acreditei que pudessem ter algum especialista capaz de as entender…
- Percebo… mas não é fácil encontrar quem tenha a disponibilidade e vontade de as alcançar… diria mesmo que será preciso desejá-las para as conseguir 'ler'...
MERGULHO

quarta-feira, 25 de março de 2009
NUMA TARDE DE ESTIO [jeans]

terça-feira, 24 de março de 2009
LEVA-ME CONTIGO

Foto © Jacqueline-W
Leva-me contigo!
Não me abandones
entre as palavras já lidas
guarda-me nas páginas
do próximo livro que leias
Não me esqueças
no meio de palavras já sublinhadas
reserva-me um espaço
entre as que mais desejas ler
Não me arrumes
entre as notícias já divulgadas
descobre-me nas do jornal
da próxima manhã
Não me largues na canção
que já não lembras
escreve-me no poema
da que ainda queres decorar
Leva-me contigo!
E lê-me todos os dias
como se fosse a segunda vez
aquela que fizeste com maior desejo
... o de confirmar a primeira leitura.
MELANCOLIA

Foto © Svetlin Aleksandrov
A neblina que dissipa
o mar que acalma
o rio que serena
a chuva que abranda
as palavras que se apaziguam
a ataraxia da alma
a impassibilidade das emoções
a placidez do tempo
o relaxamento da ansiedade
a indiferença da madrugada
o esquecimento do eu
numa manhã imperturbável
de nevoeiro de lágrimas
a encobrir a verdade do sol
segunda-feira, 23 de março de 2009
TRILHOS [trilho(s)]

pisadas por nossos passos
Dias sem glória
Memórias sem laços
Caminhos percorridos
Ligações perdidas
Silêncios eternos
Palavras indevidas
Trilhos anónimos
Transeuntes ausentes
Invernos de dor
Amores doentes
Segredos desfeitos
Vazios descuidados
Promessas incumpridas
Pactos desprezados
Tábuas molhadas
pela embriaguez da manhã
sequiosas de novos passos
numa espera quantas vezes vã?
BOM . DIA

Foto © fwmurnau
Dormias
Nada disse
Não te toquei
Contemplei-te
Divaguei
Delirei
Sonhei
Em silêncio
Nas canções que tornámos nossas
revelei-te segredos do meu coração
Segurei o meu impulso
E não te acariciei
Chamei-te minha
madrugada de sentimentos
A claridade rasgava o céu
Fiquei
Mais perto
No meu peito
Aconcheguei-te
sem te tocar
Descansei meu olhar
em ti
Li-te os poemas que me deste
Ofereci-te as palavras que escrevi
Viajei
Parti e voltei
Porque era ali
o meu lugar
Perto de ti
para te ver despertar
Não te toquei
Adorei-te
Chamei-te minha
manhã de palavras por acordar
e aguardei
esperei por uma brisa
para pousar nos teus lábios
o beijo que te desejei dar
domingo, 22 de março de 2009
LIBERTAS

sábado, 21 de março de 2009
HOJE

aliás nem existem palavras
hoje há uma distância inultrapassável
mas não dói, não entristece
hoje há uma brisa, uma água fresca, uma melodia
a correrem dentro de mim
hoje eu não quero escrever palavras
eu hoje só quero o mar ao fundo
o teu olhar no meu, em silêncio
minha mão poisada na tua
e não falar, apenas sentir
que a tua música é minha
os teus sonhos, meus desejos
e deixar-me ir ficando
a ouvir a mesma ondulação,
a mesma água, o mesmo sal,
o mesmo céu, o mesmo sol,
o mesmo vento, o mesmo arrepio,
… e…
e quando o silêncio já não durar
quando a ternura gritar
parar de estar parado,
fechar os olhos e deixar
nossos lábios colarem-se
e falarem, entre eles, coisas
que eu não sei dizer, nem falar,
nem escrever, nem cantar, nem gritar,
… só sentir
… e que neles fique
o meu gosto no teu gosto
o gosto de ti no meu gosto
quinta-feira, 19 de março de 2009
SAIS DO TEU CORPO E SORRIS

Foto © Robert Wasinger
Onde vais? Quem procuras? Buscas-te em desejos no passado? Ou apenas tentas te robustecer na frescura dum sorriso? Cansaste-te do teu corpo usado? Ou serves-te do teu sorriso para requerer as carícias que te faltam?
É teu esse corpo de mulher tantas vezes desejado, outras tantas amado. São tuas as horas em que te entregaste a paixões que te fizeram viver e fizeram de ti mulher. O tempo passa… mas a mulher fica… porque se sabe amar, continuará a sê-lo no corpo que é seu e não precisa de fugir para o passado em busca dum sorriso que já não lhe pertence. Procura sim, no teu presente, aquele que agora te sorri e torna-o teu. Grita-lhe o teu desejo e abraça-o como se não houvesse amanhã, olha-o como o pescador a um farol, perdido no meio do mar, acaricia-o, escorre por ele como a chuva num vidro em manhã de aguaceiro e segreda-lhe os teus silêncios como uma brisa num crepúsculo de estio.
E se aí chegares… então sorri… e sai do teu corpo… para entrar no daquele que queres amar.
NA PELE DA MEMÓRIA

o perfume das palavras que me disseste.
Carícias em que não nos tocámos
mas que senti.
O eco delas enleva-me num místico rio
de que não quero conhecer a foz.
Desejo apenas bebê-las
saborear-lhes cada lágrima, cada sorriso,
cada hesitação, cada certeza.
Ambiciono apenas tê-las
como minhas, como meu indumento,
o meu sangue, o meu desejo.
Cobiço apenas a sua transparência,
a sua verdade, o seu impulso.
Quero guardá-las no cofre onde nada se perde
e mesmo que diluído no tempo
se eterniza no perfume da memória.
OS MEUS ANJOS

quarta-feira, 18 de março de 2009
RE[ENCONTRO]

Foto © Anisja
- Olá!
- O…lá… Não acredito… que surpresa!...
- Quis saber como estás…
- Não acredito… mas… como soubeste?... como descobriste?...
- Quando se quer…
- É verdade. Quando se quer…
- Não me convidas para entrar?
- Claro! Desculpa… ainda estou nas nuvens…
- Pois… eu sou real.
- Claro! Claro! Não esperava… é realmente uma surpresa… por favor senta-te…
- Que tens feito?
- Há tanto tempo…
- Nem sabes quanto…
- Acredita que sei! Não duvides que sei!
- Primeiro foi difícil… foi terrível… depois… a saudade foi tomando o lugar da dor e a pouco e pouco o perfume da memória foi tomando conta da saudade…
- …
- …e viagens? Tens feito?
- … algumas. A última…
- Foi aquela que tanto desejavas?
- Não!... essa ainda não fiz…
- Mas não era dessas viagens de que falava… era das outras… das que fizemos…
- … sim!... algumas… mas nunca mais como as que fizemos juntos…
- … ainda lhes sinto o sabor… a força… a intensidade…
- Também… também…
- Lembras-te?...
- Se me lembro?... Como esquecer?...
- … e as pontes…
- As pontes?...
- … as pontes ficaram a ligar duas margens imaginárias que na realidade eram distantes, mas impossíveis de não ficarem ligadas por essas pontes… que as nossas viagens foram revelando… e construindo…
- …
- …
terça-feira, 17 de março de 2009
PARA LÁ DAQUELE PORTÃO [portão - vila viçosa]

Para lá daquele portão, em tempos, existiu uma quinta onde havia uma casa. E como em todas as quintas onde existe uma casa, haviam pessoas. Enquanto pessoas viveram nessa quinta onde havia uma casa, houve história. Depois que a casa e a quinta foram abandonadas, a história transformou-se em memória. Contam as memórias dessa história que nessa casa, daquela quinta que existiu para além do portão, houve uma família com muitas gerações. De geração em geração a quinta e casa foram sendo herdadas, sem testamentos, apenas com a vontade de preservar o que era a história dessa tal família, os seus segredos e desventuras. Numa dessas gerações houve um homem que sonhou uma utopia: por cada paixão que vivesse, plantar uma árvore de corações. Ao longo da sua vida, que nem a memória, nem a história, sabem especificar quantos anos foram, esse homem plantou um pomar com árvores de corações. Com a chegada de cada Primavera percorria vagarosamente o pomar, observava com minúcia cada árvore, acreditando que iria encontrar uma que desse o primeiro coração. As Primaveras sucederam-se… os Invernos tornaram-se, a pouco e pouco, mais rigorosos e o peso do tempo começou a curvar o agricultor de corações. Um dia, descrente quanto à fertilidade daquelas árvores, chamou o único neto e contou-lhe o seu segredo. Instruiu-o quanto ao tratamento a dar ao pomar e, como única herança, deixou-lhe o sonho de utopia. Passado algumas semanas o homem faleceu. No exterior, um vento forte varreu a quinta… o rapaz, cumprindo as indicações do avô, correu para junto das árvores e verificou-as uma a uma. Junto duma delas, caída junto à raiz, uma das suas folhas tinha as seguintes palavras sulcadas: ‘Há passos que não se recuam. Os teus guardei-os no meu coração!...’
Para lá daquele portão, em tempos, existiu uma quinta onde havia uma casa. Ou terá sido para cá do portão? Onde agora cresceram ervas daninhas… e para lá do portão seja o futuro?
[Na era digital, também da fotografia, Ampliações são as minhas revelações de algumas sugestivas imagens de SONJA VALENTINA; são ampliações escritas, obviamente pessoais, dos pormenores com vida registados pela fotógrafa]
AO PÉ DAQUELA TORRE

Foto © Emmanuel Correia
CONVERSA COM C GRANDE

Quando dois Homens Grandes se juntam, arriscamo-nos a ler palavras como estas:
“A voz é grave e pausada, sem nunca se elevar, num tom que faz silêncio à sua volta. Tom de quem é escutado com atenção e sabe que o escutam atentamente. O sol da manhã, com uma intensidade primaveril, em pleno Inverno, inunda a sala do apartamento à Lapa. Em sua própria casa pede-me autorização para fumar. Um gentleman nos vários sentidos da palavra.
…”
Um deles sempre me impressionou pela sua serenidade, pela sua certeza sem que tenha necessidade de a afirmar, pelo saber ouvir. Foi político e nunca me lembro de o ter ouvido subir o tom. Com ele aprendi ser possível admirar sem ter que concordar. É um homem grande em estatura, mas acima de tudo em convicções. E isto fá-lo, para mim, um Homem Grande. O outro é um excelente perguntador, diria eu o melhor perguntador português! Ele escreve quando pergunta. Mesmo quando o faz sem ser pela via escrita. Ele parece, sempre, saber mais do que o entrevistado e cria a ilusão de conseguir, sem que o pretenda, estar seguro da resposta antes de perguntar. Para alguns também poderá ser um homem g…, para mim é um Homem Grande.
E quando dois Homens Grandes se juntam… só poderá existir uma Conversa com C, bem grande!
[entrevista de Carlos Vaz Marques a António Barreto, na edição deste Março da Revista LER]
ADEUS

Foto © Akif [Hakan] Celebi
As tuas palavras golpearam a noite
esventraram o silêncio
para me arrancar do sono
devassaram-me o repouso
arrastaram-me na madrugada
e quando os primeiros raios de dia
rompiam a escuridão
torturavam-me como uma gota
caindo repetida e paulatinamente
numa porção de água
adeus
adeus
adeus
adeus
adeus
adeus
adeus
adeus…
segunda-feira, 16 de março de 2009
PORQUÊ?

tudo o que toco se estilhaça?
tudo o que olho se desfaz?
tudo o que cheiro se evapora?
tudo o que oiço não existe?
tudo o que saboreio se decompõe?
tudo em que acredito se revela ilusão?
de que substância corrosiva sou feito
para que nada exista em mim?
À TUA IMAGEM

Foto © Yurek
Há uma imagem de ti na tua vontade. Uma segunda personalidade que se esbate e não assume a verdade da vontade. Há um prolongamento de ti nessa imagem que saída de ti se dissolve no olhar do tempo e se atenua aos ouvidos da razão. Há uma segunda vontade em ti que esmaece, que te proporciona tanto deleite quanto a primeira, mas que insistes em tornar transparente… talvez para dissimular… quiçá se para esquecer… E é num diálogo de opacidades que te perdes… e te procuras… te encontras e te separas… te dissolves… te volatilizas. E de recusa, em recusa, buscas novos prazeres… idílicos… vividos com edacidade e logo denegados com paixão. E, de novo, partes em busca da nova certeza de ti, sempre renovada, sempre igual, sempre repetida: na tua vontade existem duas tentações! Exteriorizas a da razão, mas é a outra que te faz sonhar. E que te incomoda porque a sabes viva. E quando a empurras para trás fica sempre uma sombra de ti, transparente, a lembrar-te que há uma imagem de ti que te faz viver.
MANHÁS VAZIAS
uma história de dúvidas
desencontros de silêncios
Um mapa de emoções
encontrei em tuas mãos
banhando oceanos de sigilos
desaguando em horas de palavras
No tempo incontido
escrevemos contos infindáveis
lemos tratados
selados com abraços inventados
de memórias apagadas
por beijos escondidos
Desenhámos sombras dos dias
e na fome de noites renovadas
repartimos medos em segredo
Dançaste com asas afagadas
em madrugadas de luas perdidas
e perdemo-nos em gestos desconhecidos
Num canto imperfeito
furtaste-te a dizer teu nome
e das minhas palavras
roubaste um beijo
com que acordas todos os dias
deixando-me as manhãs vazias
domingo, 15 de março de 2009
OBRIGADO DR. PEREIRA LEAL!

Permito-me transcrever um excerto das palavras que lhe são dedicadas no programa do concerto, pelo dignitário máximo da instituição: “A história das instituições é frequentemente partilhada com a biografia de algumas pessoas que souberam libertar-se dos constrangimentos das circunstâncias, compreendendo de forma visionária a exigente responsabilidade da concretização de um projecto cuja dimensão e importância ultrapassa o mero contexto ou as limitações próprias do tempo em que surge.”
Foi admirável ver quatro maestros como Cláudio Scimone, Michel Corboz, Lawrence Foster e Joana Carneiro, dirigirem as mais de oito dezenas de membros da orquestra e do coro. Se considerarmos que, ainda, nos foi oferecida a possibilidade de ouvir a diva Barbara Hendricks e a divinal Ana Quintans [que beleza para a audição e para a vista a sua serenidade!], a noite foi irrefutavelmente magnífica. Permita-me, ainda, destacar a ‘estreia absoluta’, sob a direcção da maestrina Joana Carneiro, do sexteto constituído pelo António, pelo Miguel, pelo Zé, pelo Zé Manel, pela Isabel e pela pessoa que o substituirá: Risto Nieminen; Inigualável! E para culminar o concerto/homenagem que outra peça poderia ser melhor escolhida? O Adagietto da Sinfonia Nº 5 de Gustav Mahler, liquesce o coração mais gélido, provam-no as manifestações emocionais que alguns dos presentes não conseguiram evitar.
Lamento a ausência, tanto quanto me foi dado perceber, do representante governamental da Cultura e a ‘impossibilidade’ do representante máximo da Nação que delegou a imposição das Insígnias de Grã-Cruz Ordem do Infante D. Henrique. Como tive oportunidade de lho dizer pessoalmente, acho que lhe ‘fica muito bem’ por ser inteiramente merecida!
Hoje, senti-me um privilegiado pela oportunidade que tive de trabalhar consigo. Congratulo-me pelo respeito que sempre me concedeu, ao longo dessas duas décadas e meia, em qualquer das circunstâncias que assumi. Lembro, com igual respeito e muita ternura, os seus momentos de humor, um elogio indirecto que de si ouvi – e que aqui não cabe explicitar – mas, sobretudo, as conversas mais longas que tivemos nos últimos dias de colaboração e nas visitas que lhe fiz posteriormente, e a confiança que fez questão de sempre me demonstrar.
Porque não encontro outra forma de o expressar, hoje, limito-me a dizer: Obrigado Dr. Pereira Leal!
COM AS MINHAS MÃOS [mãos - plaza mayor, madrid]
Com as minhas mãos
eu escrevo palavras
que voam sôfregas
dentro de mim,
em busca duma fresta
para se libertarem
Com as minhas mãos
eu escrevo palavras
que desesperadas me magoam
batendo cegas
no interior do meu peito
Com as minhas mãos
eu escrevo palavras
aqui nesta cidade
onde as mãos são capazes de olhar
e os olhares acenam como mãos
Aqui nesta cidade
onde ecoam palavras de Cervantes
Que o papel fale e que a língua se cale!
ou de Lope de la Vega
O verdadeiro amor só conhece a igualdade
Aqui nesta cidade
eu escrevo palavras
que desejo deixar nas tuas mãos
para que as tuas mãos me olhem,
as minhas palavras te beijem
e o meu olhar te acaricie
Com as minhas mãos
eu escrevo palavras para ti...
Aqui nesta cidade
… Madrid
[Na era digital, também da fotografia, Ampliações são as minhas revelações de algumas sugestivas imagens de SONJA VALENTINA; são ampliações escritas, obviamente pessoais, dos pormenores com vida registados pela fotógrafa]
SEGREDOS AO MAR

Foto © Renato Corradi
olho-o… observo-o… contemplo-o…
e entro nele, deixando-me ir
no seu infinito de horizonte dissimulado
levado pela sua imensidão
perdendo-me nela
voluntariamente sem vontade
na expectativa de que me oiça
sem que tenha de lhe contar
e nas suas profundezas
possa abandonar
o que não é desejo esquecer.
sábado, 14 de março de 2009
DETIDAS...

- Aqui tem o meu BI. Posso saber porque me a pede?
- Confirma, ou nega, ser autor destas palavras, mais destas, e destas, e destas, e destas ainda, mais estas, estas, e estas, e mais estas, estas e estas…
- Confirmo, são minhas!... mas o que se passa… não percebo…
- Por determinação superior do tribunal de jurisdição voluntário, foi emitido um mandato de captura a todas as palavras por si escritas!
- … ! … e de que sou acusado? Posso saber?
- O senhor? De nada! Mas as suas palavras foram acusadas de demasiadas, excessivas, eufóricas, repetidas, insistentes, interferentes, ruidosas, genuínas, ternas, bonitas, perturbadoras, verdadeiras, inidentificáveis, sonhadoras, desejáveis, provocadoras…
- Chega!!! E… que poderei eu fazer para as defender?...
- Nada! Rigorosamente nada! Apenas calar-se!
CANTEIRO DE PALAVRAS

sexta-feira, 13 de março de 2009
DESPERDÍCIOS?

Foto © Robert Panas
Nunca serão desperdício as palavras escritas com verdade
Não são desperdício as palavras sentidas
Não são desperdício as palavras que nos tocam
Não serão desperdício as palavras que sentimos, que guardamos em silêncio, a que não podemos responder, mas que não queremos esquecer
Não são desperdício as palavras que se oferecem, que se recebem, que se aceitam
Não são desperdício as palavras que, secretamente, queremos nossas
Desperdício são as palavras que rejeitamos sem as saber olhar
Não são desperdício as palavras que nos fazem sorrir, que nos despertam emoções, sentimentos e sensações
Não são desperdício as palavras que nos fazem voar, sonhar, derreter
Não são desperdício as palavras que nos fazem gostar de nós
Não são desperdício as palavras que de tão especiais queremos guardar no lado esquerdo do peito
DE COSTAS PARA O MAR

de costas para o mar
no meu punho fechado
agasalho palavras por libertar
Na espera de tuas asas
sou pássaro adormecido
para num instante de brandura
recuperar o voo perdido
Quero cruzar oceanos de afectos
mergulhar em infinitos mares
e a teu lado planar
em céus de mil luares
Voando com vento a favor
quero rasar teu peito
e da tua boca de gaivota
ouvir a palavra aceito
Quero regar com ternura
a resistência que em ti lavras
e na tua mão fechada
depositar minhas palavras
quinta-feira, 12 de março de 2009
QUASE TUDO
O Mundo numa cidade
Um deserto num grão de areia
Um dilúvio numa gota
Um mar numa maré
Um ano num minuto
Um poema num verso
Uma infância num sorriso
Um caminho num passo
Uma vida num momento
Um desejo num olhar
Um quase tudo
… em quase nada