sábado, 18 de abril de 2009

ARE WE DANCERS? [... or are we dancers?]

Foto © Sonja Valentina

Suspensos nesta trave que nos suporta e é nossas pernas, nossos pés, somos ombros fictícios mas reais. Em nós repousarão, antes de entrarem em palco, as segundas peles que vestirão os protagonistas da noite. É a nós que confessam todo o nervoso, a ansiedade, as inseguranças, o desejo de que não haja falhas. Somos nós que as recebemos impecavelmente preparadas para vestirem os corpos, para os transformarem, para os auxiliarem a exceder-se e fazer sonhar todos os que sentados na plateia se iludirão com a magnificência desses corpos humanos mas irreais, capazes de fazer voar pensamentos, rodar vidas, inspirar desejos. É em nós que ganham ímpeto, procuram estímulo, erigem vigor. Chegam os corpos tiram-nas de cima de nós e colocam-nas em ombros de carne e osso. Durante minutos ficamos despidos. Limitados à nossa estrutura quase inexistente. Perdidos em corredores ou camarins. Atirados para cima de cadeiras, das bancadas, ou mesmo no chão. Longe da música, do palco, das luzes, das palmas. O silêncio faz-nos companhia e apenas ouvimos as conversas dos técnicos que aproveitam para se dirigir ao bar e beber mais uma cerveja, ou das zeladoras de guarda-roupa que consomem os minutos em conversas tantas vezes repetidas do quotidiano como sendo uma novela que se confunde com as novelas que querem modificar os quotidianos. Ao fundo ouvem-se aplausos, ouvem-se risos, em alguns dias lágrimas, vozes falando agora mais alto, e sobre nós começam a ser colocadas as mesmas peles, quantas vezes trocadas, porque nós não temos nome, agora mais pesadas, transpiradas, amarrotadas, mas com mais um espectáculo para contar. Agora não têm o aprumo anterior. São-nos depositadas umas por cima das outras. Temos de nos preparar para, por vezes, nos serem deixadas duas, três. Porque nenhuma nos pertence. A nenhuma pertencemos. E acabamos por ser mero local de repouso antes que nos voltem a retirá-las para as preparar para o próximo espectáculo, antes de lhes renovarem os vincos e o ar fresco de quem nunca foi ainda utilizado. E, nós, voltamos a ser ombros de metal, sozinhos, ignorados, menosprezados, eternamente sem resposta… are we human? or are we dancers? my sign is vital, my hands are cold…


[Na era digital, também da fotografia, Ampliações são as minhas revelações de algumas sugestivas imagens de SONJA VALENTINA; são ampliações escritas, obviamente pessoais, dos pormenores com vida registados pela fotógrafa]

2 comentários:

Marta disse...

Bastidores de muitas histórias!
Gostei de ler!



[aproveito, também, para lhe agradecer mais um novo cruzamento. o primeiro foi com a Sonja, cujo trabalho fotográfico admiro imenso. ontem, foi o cruzamento com a Matriz do Sonho, um blog excepcional]

Luísa disse...

Tanto motivo para reflexão...
Voltarei com mais tempo!
Beijinho terno1